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Qual é o seu destino?

  • Aline Moraes, Caio Maia
  • 12 de ago. de 2017
  • 6 min de leitura

No período da crise econômica nacional, o Uber aparece como uma alternativa para que jovens ingressem no mercado de trabalho

O carro de Afonso, que antes era usado só para passeio, hoje é uma forma de complementar a renda - Foto: Aline Moraes

Afonso Ligory, 23, é um rapaz reservado. De família simples, o jovem sempre buscou nos estudos uma maneira de crescer na vida. Recém-formado pelo Ciaba (Centro de Instrução Almirante Braz de Aguiar) como oficial de náutica, o rapaz viu sua vaga de estágio no instituto terminar. Ainda sem experiência, Afonso se tornou mais um na estatística de brasileiros desempregados.

Em situação parecida com a de Afonso estava Adolfo Lemos, 25. Até pouco tempo, Adolfo dividia suas funções entre um emprego fixo na Universidade Federal do Pará (UFPA) e alguns serviços como fotógrafo. Assim que seu contrato na Universidade terminou, Adolfo começou a procurar novos meios de complementar a renda.

Além de serem jovens desempregados e recém-egressos no mercado de trabalho, Afonso e Adolfo possuem algo em comum. Hoje, ambos são motoristas da Uber, empresa norte-americana que possui aplicativo de viagens. Com recente atividade no Brasil, a empresa coloca os usuários em contato direto com condutores cadastrados. Trabalhando diariamente, os rapazes encontraram nessa nova alternativa proporcionada pela interatividade um meio de obter sustento no cenário de crise econômica e desemprego.

Com a nova plataforma, Adolfo encontrou uma outra fonte de renda - Foto: Nayana Batista

Fundada oficialmente em junho de 2010, na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, a Uber hoje está presente em mais de 480 cidades de mais de 70 países. Com rápida expansão no mundo todo, a empresa hoje conta com mais de 15 mil funcionários e 50 milhões de usuários ativos – 13 milhões só no Brasil. Hoje, Afonso e Adolfo fazem parte dos mais de 2 milhões de motoristas ativos no planeta.

De acordo com Afonso, motorista do aplicativo há 3 semanas, o Uber é uma forma simples e prática de driblar o desemprego. Ainda com poucas oportunidades de emprego, o jovem usa o novo serviço para manter as despesas do dia a dia, enquanto procura sua recolocação no mercado de trabalho. “Eu faço meu horário. A hora que eu quero fico on-line no aplicativo e posso rodar, mas eu trabalho mais pela parte da manhã. Por questão de segurança eu prefiro não rodar à noite”, diz Afonso.

Tanto ele como Adolfo trabalham na hora que preferem, já que o aplicativo permite uma flexibilidade nos horários de trabalho. “Tem dia que eu posso trabalhar dez horas, tem dia que eu posso trabalhar só duas, três horas”, relata Adolfo.

Adolfo, inclusive, já trabalha há quatro meses com o aplicativo, mas sua principal forma de sustento ainda é por meio da fotografia. Agora ele pretende se mudar para Brasília, mas como não tem clientes fixos na nova cidade, ele usará o Uber como principal fonte de renda. “Estou indo para outro Estado e o Uber facilitou muito essa mudança. O aplicativo vai ser a minha forma de ganhar dinheiro no início”.

Seleção – Como se tornar motoristas da Uber

Segundo os motoristas, o processo para entrar no aplicativo é simples. De início, os rapazes precisaram instalar nos seus smartphones o aplicativo “Uber Drive”, diferente do aplicativo dos clientes. Nessa nova versão, os usuários realizam o cadastro e enviam fotos dos documentos necessários, como carteira de habilitação – com a especificação de exercício de atividade remunerada – e o documento do carro utilizado para fazer as corridas.

Entre suas dificuldades, Afonso cita a mudança da sua carteira de habilitação para atividade remunerada - Foto: Aline Moraes

Além desses documentos, a Uber realiza uma fiscalização rigorosa sobre os motoristas. Para se tornar um parceiro, o interessado deve enviar sua ficha criminal, além de responder diversas pesquisas de controle de qualidade. Porém, como essa fiscalização não é tão intensa com os clientes, alguns motoristas reclamam da insegurança. “Quando você se cadastra como cliente, você não tem nada, não precisa enviar toda essa documentação. Não sabemos quem levamos. Acaba se tornando muito mais perigoso você ser um motorista do que ser um passageiro”, destaca Adolfo que, apesar de nunca ter sofrido ameaças, sente-se inseguro com o novo serviço.

Tempos de crise – Como a Uber se tornou uma fonte de renda

Antes de se tornarem motoristas da Uber, Afonso e Adolfo faziam parte de uma estatística alarmante no Brasil. De acordo com a última pesquisa realizada pelo IBGE, o país contava com 4,2 milhões de desempregados, número 14% maior que do último trimestre. Além disso, em relação à taxa de desemprego do trimestre móvel, do mesmo período do ano passado, a alta foi de 2,8%.

Economista cita que Brasil não é único que passa por crises. Países como os EUA, China e Reino Unido passam por problemas similares. - Foto: Marcos César Rodrigues

De acordo com o professor da Faculdade de Economia da UFPA (Facecon) e do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local da Amazônia (PPGEDAM), André Cutrim Carvalho, Doutor em Desenvolvimento Econômico e Pós-Doutor em Economia pelo Instituto de Economia da UNICAMP, os altos índices de desemprego são decorrentes da crise econômica vivida pelo país. Devido a uma forte desaceleração econômica e, principalmente, a um clima de instabilidade institucional em decorrência do impeachment, o nível de confiança dos investidores caiu absurdamente. “Percebe-se que a crise econômica atual está sendo acompanhada pela redução dos gastos de consumo, pela queda no nível de investimento e do PIB, deflação, e um aumento atroz do número total de desempregados pelo país. Logo, estamos diante de uma crise que é econômica, mas também, política, institucional e que afeta em larga escala os mais pobres”, declara o professor.

Em relação à Uber, o professor também enxerga o aplicativo como uma boa fonte de renda. Além disso, o economista completa dizendo que “em tempos de recessão econômica, a Uber e sua utilização no Brasil são alternativas importantes contra a crise, já que possibilitam uma geração de renda adicional. Além disso, tarifas atraentes criam um mercado paralelo aos táxis convencionais, o que acaba, certamente, melhorando o setor como um todo”.

Uber x táxis – Concorrência desleal?

Com serviços mais baratos, atendimento especializado e fácil acesso, a Uber se tornou concorrente de um tradicional serviço de viagem: os táxis. Com o avanço do aplicativo no Brasil, os taxistas vêm perdendo espaço como opção ao consumidor. Ao contrário da Uber, os táxis são taxados de diversos impostos pelo Governo Federal. Para que os trabalhadores tenham algum lucro no seu trabalho, as viagens são mais caras em relação à Uber. Uma corrida que no táxi custa R$ 15,00, pode custar até R$ 8,00 pela Uber.

Devido à grande concorrência, pontos de táxis tradicionais são contrários ao aplicativo. - Foto: Nayana Batista

A queda na procura pelos táxis tem gerado revolta nos trabalhadores da categoria. Ao redor do país, são comuns relatos de agressão de motoristas de Uber. Apesar de não ter tido nenhum conflito direto com taxistas, Adolfo conta que ele tenta respeitar ao máximo e manter uma certa distância de pontos de táxis, para evitar conflitos. De acordo com ele, sua maior preocupação não é a danificação do carro, mas sim os problemas que se pode causar ao passageiro.

Ele ainda relata que alguns amigos seus já tiveram problemas com taxistas. Devido a isso, alguns motoristas de Uber evitam ao máximo levar passageiros para lugares que tenham pontos de táxis muito antigos, como o Shopping Pátio Belém e o Aeroporto.

Já Afonso não teve a mesma sorte. O jovem conta que teve um pequeno problema com um taxista: “Eles estavam ocupando alguma parcela da pista ali na Marechal Hermes e tive que parar em outro ponto para pegar o passageiro. Só que o passageiro acabou demorando e ele veio querer tomar satisfação, mas nada demais, nada grave. Ele apenas bateu no carro, aí falei assim: ‘Não bata, estou tentando ganhar meu dinheiro assim como o senhor’”.

Dentre os elevados impostos pagos, a placa do veículo é a mais cara, podendo chegar a 40 mil reais - Foto: Nayana Batista

Mas nem todos os taxistas agem com toda essa aversão ao aplicativo. Idalino Gomes, 45, exerce a profissão há 20 anos. Para ele o Uber é apenas mais uma opção de transporte para os passageiros. A única reclamação que o motorista faz é que os motoristas do Uber deveriam ser legalizados e pagar as mesmas taxas pagas pelos taxistas. “Eles têm de se legalizar como nós. Pagamos sindicato, SEMOB. Eles [Uber] não têm SEMOB, não têm Detran, não têm Inmetro. Nós pagamos tudo isso”, opina o motorista.

A luta pela regulamentação

Essa questão da legalidade e regulamentação da Uber já esteve em pauta na Câmara Municipal de Belém. Por unanimidade, o projeto de lei que proíbe a utilização de aplicativos para oferta de transporte foi aprovado. Todos os 29 vereadores presentes ao plenário disseram “sim” ao projeto de lei de autoria do presidente da Casa, vereador Orlando Reis (PSB).

De acordo com o advogado Bernardo Lima, em âmbito federal, existem dois projetos de lei, um na Câmara dos Deputados visando à proibição da Uber (pl 2316/15) e um no Senado querendo a sua legalização e regulamentação (pl 530/15). Também existem diversas leis municipais, devido ao entendimento de cada cidade sobre o assunto. Ainda segundo o advogado, o que dificulta mais a regulamentação do aplicativo é a burocracia para se criar uma lei federal. “No Congresso Nacional são 81 Senadores e 513 deputados, fora o grande número de comissões que analisam a lei antes dela ir para votação”, destaca.

Bernardo também cita que o principal argumento dado pelos vereadores para a proibição do aplicativo em Belém foi de que “não se pode banalizar o transporte de passageiros”, e que “não resolverá o problema de mobilidade de Belém”.

Bernardo afirma que a lei que proíbe a Uber em Belém existe, mesmo que vereadores continuem promovendo debates na Câmara Municipal sobre o assunto. “A Uber vem funcionando com base na lei de política nacional de mobilidade urbana, que apesar de não tratar especificamente sobre o aplicativo, fala sobre o direito dos cidadãos de possuir acesso a meios eficientes de se locomover por suas cidades”, declara.

Por fim, o advogado afirma: “Eu vi no Facebook uma frase que se relacionava com a Uber: Se a lâmpada fosse criada no Brasil, ela iria ser proibida pela pressão dos fabricantes de velas. Achei muito aplicável ao que ocorreu em Belém”.


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